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quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Racista, machista e homofóbico jamais. Mas gordofóbico tudo bem?

Agradeço todos os dias por viver num meio no qual convivo com pessoas que, em sua grande maioria, não emitem nem toleram comentários racistas, homofóbicos, machistas ou discriminatórios em geral, nas suas mais diversas e infelizes formas.
Felizmente, vivemos numa sociedade que suporta cada vez menos a ignorância e a pobreza de espírito.
No entanto, me canso de ver essas mesmas pessoas, supostamente tão sensatas, dizendo, sem qualquer pudor, culpa ou constrangimento algo desnecessário e agressivo sobre “aquele gordo” ou “uma gorda aí”.
Me parece haver uma espécie de “zona franca” na qual as pessoas resolveram que falar de forma discriminatória de gente que está acima do peso ideal, teoricamente não tem problema, não é discriminação, não é errado.
Frequentemente, a justificativa é que “hoje em dia, só é gordo quem quer”. Mentira. Todos sabemos o quão mentiroso isso é. Se fosse assim, com certeza não veríamos o Ministério da Saúde divulgar que quase 50% da população brasileira está acima do peso.
Obviamente, não estou afirmando que o sobrepeso e a obesidade devam ser encarados como fatos imutáveis ou que não haja necessidade de combatê-los. Claro que não. Questões de saúde devem ser prioridade para qualquer pessoa. O que estou falando é que o excesso de peso alheio não dá a ninguém a prerrogativa de julgá-lo. Só isso.
A pessoa que está acima do peso com frequência é vista como preguiçosa, descuidada, como alguém que poderia estar magro e esbelto e optou por não estar. Interessante que muitas das pessoas que falam “daquele gordo” estão entre aquelas que há anos afirmam que vão perder 2 quilinhos para o verão e nunca o fazem. “Mas na hora que eu quiser eu perco”. Bullshit. Você quer perder e não perde.
Fazer dieta nunca é fácil. Renunciar à cervejinha, ao chocolatinho, ao pãozinho francês, à carne vermelha é duro. Correr na esteira também. Mas mais difícil do que isso é lutar contra um metabolismo lento, uma tireóide desobediente, uma genética desfavorável, um pós-gravidez cruel, uma menopausa avassaladora. E ainda pior é ter que conviver com os olhares tortos, as risadas por detrás das mãos, os comentários que se finge não perceber por instinto de sobrevivência.
E se a pessoa que está acima do peso for mulher, pior ainda. Com a persistente ideia de mulher objeto, uma mulher gorda é vista como sinônimo de inutilidade. Afinal, “para que serve uma mulher gorda?”. Só para zoar na balada com seus “bróder”, né? Credo.
Constata-se o óbvio: gordura não é escolha. E alguns lutam mais contra isso, outros menos.
E daí? O que você tem a ver com isso?
Alguém te julga porque você ainda não foi consultar um psicólogo para cuidar dos seus traumas de infância? Ou porque ainda não foi no dermatologista ver aquela pinta que pode ser câncer de pele? Será que você não tem problemas até mais graves do que muita “gente gorda”, mas que apenas não são tão evidentes?
Será que não tem muita “gente gorda” mais saudável e bem resolvida do que você? Será que não tem gente acima do peso com uma auto estima bem maior do que a sua? Mais seguro, mais bem disposto, mais feliz?
O fato é, com que direito as pessoas decidiram condenar os quilos alheios? E, pior, por que elas resolveram achar que chamar alguém de gordo, com ar pejorativo ou hostil não é algo grave? Não é tão asqueroso quanto discriminação por cor, orientação sexual ou gênero?
Pois é. O peso alheio não te diz respeito. O que diz respeito a todos nós é aquela ideia antiga, antiquada, talvez um pouco demodée, de respeitar os outros, ainda que sem patente alta ou bigode grosso. Se não por vontade ou generosidade, talvez por decência. Será que soa tão estranho assim?

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