quarta-feira, 1 de janeiro de 2020
segunda-feira, 28 de outubro de 2019
“A empresa em que trabalhava me demitiu por eu ser negra e gorda”
Técnica em nutrição, Fernanda Franco, de 40 anos, foi demitida do “trabalho dos sonhos” com a justificativa de que sua aparência, "negra e gorda", não agradava os "frequentadores do restaurante". Desempregada e com a mãe doente, ela recebeu apoio de amigos para comer e comprar medicamentos, até dar a volta por cima e abrir seu próprio restaurante em São Carlos, interior de São Paulo
A técnica em nutrição Fernanda Franco, que foi demitida com a justificativa de que ela era "negra e gorda" (Foto: arquivo pessoal) |
Em 1986, a instituição onde minha mãe trabalhava abriu uma cozinha ainda maior, que fornecia alimentação para outros lugares. A produção era enorme e, nesse espaço, eu já não tinha tanto acesso, mas fazia visitas para espiar e admirar minha mãe liderando uma grande equipe de cozinheiros. Foi a primeira vez que vi uma nutricionista em ação, o que me encantou. Permaneci ali até os 18 anos: trabalhei no berçário, no escritório e, claro, na cozinha, com minha mãe, e decidi que meu destino era ser técnica em nutrição, sonho que realizei em 2008, após dois anos de intensos estudos.
Alguns anos antes, em 2001, vivi uma situação que mudou minha vida completamente. Ao perder meu pai, fiquei muito mal: quis morrer, tive depressão e desenvolvi transtornos alimentares. De 80 fui para 160 quilos rapidamente.
Conto isso porque, no final de 2018, uma amiga me indicou a uma vaga numa empresa que gerencia vários restaurantes. Era uma proposta irrecusável, primeiramente, pelo salário, ótimo, e também pelo grande número de funcionários que o restaurante atende, um desafio que iria acrescentar muito ao meu currículo. Parecia o ‘emprego dos sonhos’.
Minha irmã mais nova, Débora, trabalha comigo. Espero nunca mais trabalhar para ninguém e nunca mais viver tamanha humilhação. Vou lutar pelo que acredito e mostrar que posso ser uma nutricionista negra e gorda, sem ter de dar satisfações para essa sociedade hipócrita."
sábado, 3 de agosto de 2019
terça-feira, 16 de julho de 2019
Visitinha ao Spa das Sobrancelhas - Tingimento de Cìlios
Vocês bem sabem que estou na luta com a chikungunya há três longos anos né, e que ela me trouxe como sequela a fibromialgia e com isso eu sinto muitas dores e minha sensibilidade à dor aumentou muito, mesmo para coisas simples como fazer a sobrancelha. E sem a minha coordenação motora completa de volta, nem passar um rímel direito eu consigo certos dias, por isso decidi visitar o Spa das Sobrancelhas de perto de casa e além do Design de Sobrancelhas, também tingir.
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Antes |
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Durante |
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Quatro dias depois e a henna da sobrancelha ainda está lá |
segunda-feira, 8 de julho de 2019
Tocar o Foda-se
Então na dúvida, foda-se!
sábado, 13 de abril de 2019
terça-feira, 5 de fevereiro de 2019
sexta-feira, 25 de janeiro de 2019
sábado, 12 de janeiro de 2019
terça-feira, 8 de janeiro de 2019
domingo, 6 de janeiro de 2019
domingo, 23 de dezembro de 2018
sábado, 22 de dezembro de 2018
Voltei de Novo
Eu estou numa batida de trabalho muito acelerada, que tem me levado aos meus limites e muitas vezes até mesmo a ultrapassá-los. Embora desgastante, é muito gratificante ver o quanto sou capaz de produzir, mesmo que isso drene minha energia e eu não consiga tocar meus projetos paralelos. É bom saber que estou voltando a evoluir, mesmo que a passos de formiguinha, ainda que para o ritmo ultra acelerado do Rio de Janeiro pareça nada, como eu sempre costumo ouvir hahaha Para euzinha, esse ser humaninho aqui que vos escreve mesmo com dor, sim, ainda sinto dor, cada conquista, leve melhora, é um baita motivo pra celebrar.
Antes eu me sentia uma múmia, mal conseguia dar 500 passos por dia, hoje eu ando em média 3 a 4 km todo dia, contando todos os passos, já consigo pegar um trem, um metrô, consigo andar por mais de um minuto. Antes eu era um muminha cheia de dor e adesivos analgésicos e térmicos pelo corpo, cheia de dor, encurvada, triste e chorosa.
Agora estou recuperando minha mobilidade até então ultra reduzida, estou correndo atrás do meu condicionamento físico perdido, pois fui obrigada a levar um estilo de vida estritamente sedentário e gente na boa, quem aí é sedentário ao extremo porque quer, como consegue viver assim? Socorro! Odiei, odiei, odiei perder minha facilidade de subir ladeirões, andar horrores. É horrível você não conseguir andar direito, sentir dor, não ter resistência, como vocês conseguem só andar de carro? Faz isso não gente! Essa vida de só andar de Uber não faz bem pro coração nem pro bolso não, se você tem saúde, se você consegue andar, faça uso da sua saúde, saiba que tem gente que daria tudo pra ter a sua capacidade física para sair andando por aí, mas, por motivo de doença não consegue.
Eu queria estar no Hashtag Moda Plus hoje, mas ainda não me recuperei o bastante para encarar o desgaste físico de comparecer a eventos, mas tô animada porque sei que estou mais perto de conferir essa maravilha que mudou o cenário da Moda Gorda carioca.
quarta-feira, 14 de novembro de 2018
sexta-feira, 9 de novembro de 2018
Empresas são penalizadas por gordofobia no trabalho
A "gordofobia" é uma forma de discriminação, caracterizada pela falta de tolerância com pessoas consideradas acima do peso ideal para aquilo que se convencionou como "padrão de beleza". Apesar da obesidade (18,9%) e o sobrepeso (54%) serem uma realidade para mais de 70% da população brasileira (Ministério da Saúde, 2018), os episódios envolvendo gordofobia têm sido recorrentes e, não raro, resultam no suicídio da vítima.
É o caso de duas adolescentes de 12 e 17 anos que cometeram suicídio após serem constantemente agredidas nas escolas em que estudavam. Recentemente, ao publicar nas redes sociais um vídeo para promover o movimento "outubro rosa", uma bailarina foi vítima de gordofobia, sofrendo ofensas online com relação à sua forma física.
Em outro episódio, uma cozinheira sofreu assédio moral equiparado à discriminação por gordofobia no ambiente de trabalho, praticada por uma colega. Neste caso, a Justiça do Trabalho condenou a empresa por não zelar pelo ambiente de trabalho e proteger a trabalhadora.
Vale lembrar que, seja online ou offline, os atos de gordofobia configuram crime e estão sujeitos à reparação de danos morais e materiais na esfera civil.
Por isso, as vítimas, ou em sua ausência, seus familiares, devem registrar boletim de ocorrência junto à autoridade policial competente, apresentando eventuais provas das agressões, como prints das redes sociais identificando as ofensas e seus autores, gravações, testemunhas, etc., além de buscar, o mais rápido possível, apoio jurídico especializado, para que possam ser adequadamente orientadas a respeito da condução da ação penal, mecanismos jurídicos para fazer cessar as agressões e vias de reparação dos danos sofridos.
Nesse sentido, decisão recente do Tribunal Superior do Trabalho (TST) reconheceu a culpa gravíssima da empresa e dobrou o valor da indenização por danos morais devido a uma trabalhadora vítima de gordofobia.
Por isso, a gordofobia extrapola a preocupação exclusiva das vítimas, e passa a ser um problema para as empresas que são ou podem vir a ser palco das agressões.
É pacífico na jurisprudência que as empresas são responsáveis por manter um ambiente saudável nas suas dependências, devendo coibir toda e qualquer prática ofensiva à integridade moral e física das pessoas, bem como por identificar e fazer cessar eventuais agressões que sejam praticadas contra seus colaboradores ou clientes.
Isso significa que, além do autor-agressor ou de seus responsáveis legais, as empresas podem - e devem - responder judicialmente pela reparação dos danos experimentados pelas vítimas de gordofobia e até mesmo por seus familiares, quando for o caso.
Diante desse quadro, a recomendação é que gestores de recursos humanos e relacionamento com o cliente dediquem atenção especial ao tema, a fim de que possam criar políticas de prevenção à gordofobia e verificar se a empresa possui rotinas bem definidas que permitam a denúncia, identificação e solução dos casos com a maior rapidez possível, evitando ao máximo a exposição da vítima.
Para isso, a assessoria jurídica especializada é capaz de orientar a condução dos casos de gordofobia adequadamente, atuando com eficiência com vistas a limitar a extensão dos danos e estabelecer os remédios jurídicos aplicáveis a cada caso.
Daniela Lopomo Beteto é advogada especialista em Direito do Trabalho no Trevisioli Advogados
terça-feira, 23 de outubro de 2018
Semana da Visibilidade Assexual 2018
Uma nova semana da visibilidade assexual chegou e quase não se vê nada nas redes sociais brasileiras sobre, o que já era esperado, ainda mais no período eleitoral que estamos vivendo, mas, este post não é sobre isto. Poucos devem lembrar, eu me descobri assexual e revelei isto para as seguidoras e algumas pessoas se interessaram pelo assunto. E me trouxe uma alegria imensa saber que existiam outras pessoas como eu, no caso demissexual. Eu sempre tive essa coisa de precisar me conectar para ter algo com alguém, principalmente sexo. Eu nunca funcionei sem um click, uma ligação com o outro e me sentia tão antiquada por isso.
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A cada ano a data da semana da visibilidade assexual muda |
Não era uma escolha racional, era simplesmente como eu funcionava, e eu não entendia como podia ser assim, me causava angústia não entender como eu poderia ser tão diferente das minhas outras amigas que se interessavam por inúmeros caras desconhecidos e conseguiam ter sexo casual sem nem precisar conversar muito antes, ou conhecer um pouco o outro. Achavam que eu era santinha, mas, não era isso, nunca foi isso.
E o mais louco na assexualidade é que não há uma regra fixa, UM JEITO CERTO ou errado de ser assexual (ace), cada um vivencia a sua sexualidade de sua própria maneira, uns com sexo sim, outros sem sexo nenhum. A assexualidade é um termo guarda-chuva, um espectro onde você pode experimentar zero atração sexual ou alguma atração sexual em condições diferentes do alosexuais, como é o caso dos gray-a e demissexuais. Eu acho errado classificar os demi e gray-A fora do espectro ace e invalidar sua existência, dizendo que só pode ser ace, se você experiencia nenhuma atração sexual. Eu sem uma ligação, sem uma conexão, sou totalmente ace, mas se crio esse laço com alguém aí a atração surge, o que não me torna menos ace que um arromântico por exemplo. A minha excitação requer uma ligação além do estímulo que funciona com a maioria das pessoas, seria uma forma simplista de explicar, mas acho que é por aí.
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Alguns símbolos ace para nos reconehcerem |
domingo, 30 de setembro de 2018
A Arte de Viver Com Coração Partido
sábado, 29 de setembro de 2018
terça-feira, 17 de julho de 2018
Chikungunya provoca doenças irreversíveis nos olhos e membros inferiores
Farmacêutico pela Universidade Federal de Sergipe - UFS.
Habilitação em Bioquímica Clínica pela Universidade Federal de Sergipe - UFS.
Especialista em Administração de Empresas pela FIJ-RJ.
Especialista em Farmacologia e Interações Medicamentosas pela Uninter-IBPEX.
segunda-feira, 16 de abril de 2018
GORDOFOBIA: Cartilha que associa gordo a botijão é distribuída a CRIANÇAS em escola de São José
A matéria abaixo foi publicada no G1, abaixo na íntegra.
Vou me manifestar sobre este absurdo em outro post.
Cartilha foi distribuída em escola municipal em ação contra obesidade infantil. Especialistas questionam a maneira como o tema foi abordado. Pais reclamam que material reforça bullying contra as crianças. Prefeitura vai recolher material.
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Em cartilha distribuída pela prefeitura, personagem engorda e diz que virou um botijão (Foto: Reprodução) |
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Ao se ver no espelho, personagem se assusta por estar gorda' (Foto: Reprodução) |
Outro lado
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Em tirinha, personagem questiona se, estando gorda, poderia passar pela porta (Foto: Reprodução) |
A matéria foi publicada no G1 na íntegra, incluindo as legendas das imagens. Vou me manifestar sobre isto em outro post.
Publicado originalmente aqui
quarta-feira, 14 de março de 2018
Ela Morreu?
Alguém perguntou lá no canal.
Morri ainda não gente, mas a chikungunya está quase conseguindo isso nestes dois anos de dores.
sábado, 6 de janeiro de 2018
Verão Sem Padrão - Relato Masculino
Eu sempre recebo relatos de moças sobre como nossas postagens nas redes as ajudaram. E não me recordo de ter recebido antes um relato masculino.
Ao abrir o inbox eu lembrei que tinha dado umas dicas de moda praia masculina para um moço chamado André, no final do ano e decidi perguntar como havia sido a viagem e tal.
E fiquei mega feliz em ver este depoimento dele como resposta:
"Retornei ontem, viagem de fim de ano junto com primos.
Confesso que foi uma das viagens mais fantásticas que já fiz, ir a praia depois de muitos anos me fez refletir muita coisa, coisas do tipo que gordo pode sim ir a praia, tomar sol, tomar cerveja, entrar no mar, mostrar o corpo sem medo...
Fiz de tudo que tinha direito, quanto ao que as pessoas pensavam ou imaginavam, pouco me importava, o que eu mais curti foi estar sem camiseta, curtir o mar e aproveitar cada segundo ali....foi mágico, maravilhoso....mas todo este sentimento de coragem trabalhei dias antes comigo mesmo....disse a mim mesmo, que eu posso e eu consigo me divertir....mesmo as pessoas olhando torto, pois para alguns ser gordo é uma doença e ir a praia então é absurdo...
Provei ao contrário...e aproveitei...amei as dicas e deram super certo....sigo sua rede social já faz um tempinho....
Quase não vejo depoimento de homens, mas eu faço questão de dizer que amo meu corpo..e todos a minha volta...beijao...e feliz 2018...."
Moços gordos VOCÊS também podem tudooo!!
Chega de se privar né!
Bjs gordos,
Claudia Rocha GorDivah
terça-feira, 12 de dezembro de 2017
Não Posso Ser Seu Contatinho
Muito menos um dos seus esquemas. Eu sou demissexual, isto quer dizer que eu preciso de vínculo , laço, conexão, identificação para talvez sentir vontade de ficar com você. Eu não consigo usar um Tinder ou interagir em outros apps e já marcar um encontro, muito menos fazer isso com várias pessoas ao mesmo tempo. Eu nem consigo com uma, quanto mais com vários esquemas.
Eu não escolho ser assim, simplesmente sou desse jeito, nasci assim. Eu sou aquela paradona que gosta e precisa conversar muito, ser ouvida e também ouvir, uma que vai conversar de boas com você por horas se você deixar, sobre os mais variados assuntos. Comigo não haverá joguinhos porque eu nunca aprendi a jogar Sedução, haverá sinceridade, transparência e verdade. Se eu quiser algo eu vou dizer sim, se não quiser eu direi não.
Se eu me identificar com você, ainda assim eu vou querer saber mais sobre ti, te conhecer melhor para então ter qualquer coisa física. E se eu aceitar me encontrar com você, não se espante com a minha total falta de familiaridade com protocolos de encontros. Se eu quiser rir à vontade no primeiro encontro, eu vou rir, eu não vou estar preocupada em fazer você gostar de mim e fazer você querer me convidar de novo, eu vou estar pensando em nada, estarei agindo naturalmente pois não preciso te convencer de nada, nem me convencer de nada. Eu apenas estarei consciente do e no momento presente.
Quando eu te digo que não tenho contatinhos e você duvida, eu sorrio pois você não sabe a praga que é ser demissexual num mundo cheio de apps pós Tinder. TODO MUNDO tem vários esquemas e contatinhos, mas, eu realmente nem tenho um. Me conectar com alguém é raro e mais raro ainda é esta pessoa querer algo comigo. E sem esta conexão sou totalmente assexual, ninguém me desperta interesse. E com esta conexão, só a pessoa com quem estou ligada, me desperta desejo e vontade de estar junto, bem junto. Eu sei que para quem não vive a assexualidade, isto parece absurdo, mas, para uma demissexual que não é polirromântica é a mais pura verdade.
Eu não escolhi ser assim, apenas nasci deste jeito.
sexta-feira, 24 de novembro de 2017
Vou Fugir Deste Lugar Baby
quinta-feira, 23 de novembro de 2017
Venha ver o pôr do sol – Lygia Fagundes Telles
ELA SUBIU sem pressa a tortuosa ladeira. À medida que avançava, as casas iam rareando, modestas casas espalhadas sem simetria e ilhadas em terrenos baldios. No meio da rua sem calçamento, coberta aqui e ali por um mato rasteiro, algumas crianças brincavam de roda. A débil cantiga infantil era a única nota viva na quietude da tarde.
Ele a esperava encostado a uma árvore. Esguio e magro, metido num largo blusão azul-marinho, cabelos crescidos e desalinhados, tinham um jeito jovial de estudante.
– Minha querida Raquel.
Ela encarou-o, séria. E olhou para os próprios sapatos.
– Vejam que lama. Só mesmo você inventaria um encontro num lugar destes. Que idéia, Ricardo, que idéia! Tive que descer do taxi lá longe, jamais ele chegaria aqui em cima.
Ele sorriu entre malicioso e ingênuo.
– Jamais, não é? Pensei que viesse vestida esportivamente e agora me aparece nessa elegância…Quando você andava comigo, usava uns sapatões de sete-léguas, lembra?
– Foi para falar sobre isso que você me fez subir até aqui? – perguntou ela, guardando as luvas na bolsa. Tirou um cigarro. – Hem?!
– Ah, Raquel… – e ele tomou-a pelo braço rindo.
– Você está uma coisa de linda. E fuma agora uns cigarrinhos pilantras, azul e dourado…Juro que eu tinha que ver uma vez toda essa beleza, sentir esse perfume. Então fiz mal?
– Podia ter escolhido um outro lugar, não? – Abrandara a voz – E que é isso aí? Um cemitério?
Ele voltou-se para o velho muro arruinado. Indicou com o olhar o portão de ferro, carcomido pela ferrugem.
– Cemitério abandonado, meu anjo. Vivos e mortos, desertaram todos. Nem os fantasmas sobraram, olha aí como as criancinhas brincam sem medo – acrescentou, lançando um olhar às crianças rodando na sua ciranda. Ela tragou lentamente. Soprou a fumaça na cara do companheiro. Sorriu. – Ricardo e suas idéias. E agora? Qual é o programa?
Brandamente ele a tomou pela cintura.
– Conheço bem tudo isso, minha gente está enterrada aí. Vamos entrar um instante e te mostrarei o pôr do sol mais lindo do mundo.
Perplexa, ela encarou-o um instante. E vergou a cabeça para trás numa risada.
– Ver o pôr do sol!…Ah, meu Deus…Fabuloso, fabuloso!…Me implora um último encontro, me atormenta dias seguidos, me faz vir de longe para esta buraqueira, só mais uma vez, só mais uma! E para quê? Para ver o pôr do sol num cemitério…
Ele riu também, afetando encabulamento como um menino pilhado em falta.
– Raquel minha querida, não faça assim comigo. Você sabe que eu gostaria era de te levar ao meu apartamento, mas fiquei mais pobre ainda, como se isso fosse possível. Moro agora numa pensão horrenda, a dona é uma Medusa que vive espiando pelo buraco da fechadura…
– E você acha que eu iria?
– Não se zangue, sei que não iria, você está sendo fidelíssima. Então pensei, se pudéssemos conversar um instante numa rua afastada…- disse ele, aproximando-se mais. Acariciou-lhe o braço com as pontas dos dedos. Ficou sério. E aos poucos, inúmeras rugazinhas foram se formando em redor dos seus olhos ligeiramente apertados. Os leques de rugas se aprofundaram numa expressão astuta. Não era nesse instante tão jovem como aparentava. Mas logo sorriu e a rede de rugas desapareceu sem deixar vestígio. Voltou-lhe novamente o ar inexperiente e meio desatento –Você fez bem em vir.
– Quer dizer que o programa… E não podíamos tomar alguma coisa num bar?
– Estou sem dinheiro, meu anjo, vê se entende.
– Mas eu pago.
– Com o dinheiro dele? Prefiro beber formicida. Escolhi este passeio porque é de graça e muito decente, não pode haver passeio mais decente, não concorda comigo? Até romântico.
Ela olhou em redor. Puxou o braço que ele apertava.
– Foi um risco enorme Ricardo. Ele é ciumentíssimo. Está farto de saber que tive meus casos. Se nos pilha juntos, então sim, quero ver se alguma das suas fabulosas idéias vai me consertar a vida.
– Mas me lembrei deste lugar justamente porque não quero que você se arrisque, meu anjo. Não tem lugar mais discreto do que um cemitério abandonado, veja, completamente abandonado – prosseguiu ele, abrindo o portão. Os velhos gonzos gemeram. – Jamais seu amigo ou um amigo do seu amigo saberá que estivemos aqui.
– É um risco enorme, já disse . Não insista nessas brincadeiras, por favor. E se vem um enterro? Não suporto enterros.
– Mas enterro de quem? Raquel, Raquel, quantas vezes preciso repetir a mesma coisa?! Há séculos ninguém mais é enterrado aqui, acho que nem os ossos sobraram, que bobagem. Vem comigo, pode me dar o braço, não tenha medo…
O mato rasteiro dominava tudo. E, não satisfeito de ter se alastrado furioso pelos canteiros, subira pelas sepulturas, infiltrando-se ávido pelos rachões dos mármores, invadira alamedas de pedregulhos esverdinhados, como se quisesse com a sua violenta força de vida cobrir para sempre os últimos vestígios da morte. Foram andando vagarosamente pela longa alameda banhada de sol. Os passos de ambos ressoavam sonoros como uma estranha música feita do som das folhas secas trituradas sobre os pedregulhos. Amuada mas obediente, ela se deixava conduzir como uma criança. Às vezes mostrava certa curiosidade por uma ou outra sepultura com os pálidos medalhões de retratos esmaltados.
– É imenso, hem? E tão miserável, nunca vi um cemitério mais miserável, é deprimente – exclamou ela atirando a ponta do cigarro na direção de um anjinho de cabeça decepada.- Vamos embora, Ricardo, chega.
– Ah, Raquel, olha um pouco para esta tarde! Deprimente por quê? Não sei onde foi que eu li, a beleza não está nem na luz da manhã nem na sombra da tarde, está no crepúsculo, nesse meio-tom, nessa ambigüidade. Estou lhe dando um crepúsculo numa bandeja e você se queixa.
– Não gosto de cemitério, já disse. E ainda mais cemitério pobre.
Delicadamente ele beijou-lhe a mão.
– Você prometeu dar um fim de tarde a este seu escravo.
– É, mas fiz mal. Pode ser muito engraçado, mas não quero me arriscar mais.
– Ele é tão rico assim?
– Riquíssimo. Vai me levar agora numa viagem fabulosa até o Oriente. Já ouviu falar no Oriente? Vamos até o Oriente, meu caro…
Ele apanhou um pedregulho e fechou-o na mão. A pequenina rede de rugas voltou a se estender em redor dos seus olhos. A fisionomia, tão aberta e lisa, repentinamente escureceu, envelhecida. Mas logo o sorriso reapareceu e as rugazinhas sumiram.
– Eu também te levei um dia para passear de barco, lembra?
Recostando a cabeça no ombro do homem, ela retardou o passo.
– Sabe Ricardo, acho que você é mesmo tantã…Mas, apesar de tudo, tenho às vezes saudade daquele tempo. Que ano aquele! Palavra que, quando penso, não entendo até hoje como agüentei tanto, imagine um ano.
– É que você tinha lido A dama das Camélias, ficou assim toda frágil, toda sentimental. E agora? Que romance você está lendo agora. Hem?
– Nenhum – respondeu ela, franzindo os lábios. Deteve-se para ler a inscrição de uma laje despedaçada: – A minha querida esposa, eternas saudades – leu em voz baixa. Fez um muxoxo.- Pois sim. Durou pouco essa eternidade.
Ele atirou o pedregulho num canteiro ressequido.
Mas é esse abandono na morte que faz o encanto disto. Não se encontra mais a menor intervenção dos vivos, a estúpida intervenção dos vivos. Veja- disse, apontando uma sepultura fendida, a erva daninha brotando insólita de dentro da fenda -, o musgo já cobriu o nome na pedra. Por cima do musgo, ainda virão as raízes, depois as folhas…Esta a morte perfeita, nem lembrança, nem saudade, nem o nome sequer. Nem isso.
Ela aconchegou-se mais a ele. Bocejou.
– Está bem, mas agora vamos embora que já me diverti muito, faz tempo que não me divirto tanto, só mesmo um cara como você podia me fazer divertir assim – Deu-lhe um rápido beijo na face. – Chega Ricardo, quero ir embora.
– Mais alguns passos…
– Mas este cemitério não acaba mais, já andamos quilômetros! – Olhou para atrás. – Nunca andei tanto, Ricardo, vou ficar exausta.
– A boa vida te deixou preguiçosa. Que feio – lamentou ele, impelindo-a para frente. – Dobrando esta alameda, fica o jazigo da minha gente, é de lá que se vê o pôr do sol. – E, tomando-a pela cintura: – Sabe, Raquel, andei muitas vezes por aqui de mãos dadas com minha prima. Tínhamos então doze anos. Todos os domingos minha mãe vinha trazer flores e arrumar nossa capelinha onde já estava enterrado meu pai. Eu e minha priminha vínhamos com ela e ficávamos por aí, de mãos dadas, fazendo tantos planos. Agora as duas estão mortas.
– Sua prima também?
– Também. Morreu quando completou quinze anos. Não era propriamente bonita, mas tinha uns olhos…Eram assim verdes como os seus, parecidos com os seus. Extraordinário, Raquel, extraordinário como vocês duas…Penso agora que toda a beleza dela residia apenas nos olhos, assim meio oblíquos, como os seus.
– Vocês se amaram?
– Ela me amou. Foi a única criatura que…- Fez um gesto. – Enfim não tem importância.
Raquel tirou-lhe o cigarro, tragou e depois devolveu-o
– Eu gostei de você, Ricardo.
– E eu te amei. E te amo ainda. Percebe agora a diferença?
Um pássaro rompeu o cipreste e soltou um grito. Ela estremeceu.
– Esfriou, não? Vamos embora.
– Já chegamos, meu anjo. Aqui estão meus mortos.
Pararam diante de uma capelinha coberta de alto a baixo por uma trepadeira selvagem, que a envolvia num furioso abraço de cipós e folhas. A estreita porta rangeu quando ele a abriu de par em par. A luz invadiu um cubículo de paredes enegrecidas, cheias de estrias de antigas goteiras. No centro do cubículo, um altar meio desmantelado, coberto por uma toalha que adquirira a cor do tempo. Dois vasos de desbotada opalina ladeavam um tosco crucifixo de madeira. Entre os braços da cruz, uma aranha tecera dois triângulos de teias já rompidas, pendendo como farrapos de um manto que alguém colocara sobre os ombro do Cristo. Na parede lateral, à direita da porta, uma portinhola de ferro dando acesso para uma escada de pedra, descendo em caracol para a catacumba.
Ela entrou na ponta dos pés, evitando roçar mesmo de leve naqueles restos da capelinha.
– Que triste é isto, Ricardo. Nunca mais você esteve aqui?
Ele tocou na face da imagem recoberta de poeira. Sorriu melancólico.
– Sei que você gostaria de encontrar tudo limpinho, flores nos vasos, velas, sinais da minha dedicação, certo?
– Mas já disse que o que eu mais amo neste cemitério é precisamente esse abandono, esta solidão. As pontes com o outro mundo foram cortadas e aqui a morte se isolou total. Absoluta.
Ela adiantou-se e espiou através das enferrujadas barras de ferro da portinhola. Na semi-obscuridade do subsolo, os gavetões se estendiam ao longo das quatro paredes que formavam um estreito retângulo cinzento.
– E lá embaixo?
– Pois lá estão as gavetas. E, nas gavetas, minhas raízes. Pó, meu anjo, pó- murmurou ele. Abriu a portinhola e desceu a escada. Aproximou-se de uma gaveta no centro da parede, segurando firme na alça de bronze, como se fosse puxá-la. – A cômoda de pedra. Não é grandiosa?
Detendo-se no topo da escada, ela inclinou-se mais para ver melhor.
– Todas estas gavetas estão cheias?
– Cheias?…- Sorriu.- Só as que tem o retrato e a inscrição, está vendo? Nesta está o retrato da minha mãe, aqui ficou minha mãe- prosseguiu ele, tocando com as pontas dos dedos num medalhão esmaltado, embutido no centro da gaveta.
Ela cruzou os braços. Falou baixinho, um ligeiro tremor na voz.
– Vamos, Ricardo, vamos.
– Você está com medo?
– Claro que não, estou é com frio. Suba e vamos embora, estou com frio!
Ele não respondeu. Adiantara-se até um dos gavetões na parede oposta e acendeu um fósforo. Inclinou-se para o medalhão frouxamente iluminado:
– A priminha Maria Emília. Lembro-me até do dia em que tirou esse retrato. Foi umas duas semanas antes de morrer… Prendeu os cabelos com uma fita azul e vejo-a se exibir, estou bonita? Estou bonita?…- Falava agora consigo mesmo, doce e gravemente.- Não, não é que fosse bonita, mas os olhos…Venha ver, Raquel, é impressionante como tinha olhos iguais aos seus.
Ela desceu a escada, encolhendo-se para não esbarrar em nada.
– Que frio que faz aqui. E que escuro, não estou enxergando…
Acendendo outro fósforo, ele ofereceu-o à companheira.
– Pegue, dá para ver muito bem…- Afastou-se para o lado.- Repare nos olhos.
– Mas estão tão desbotados, mal se vê que é uma moça…- Antes da chama se apagar, aproximou-a da inscrição feita na pedra. Leu em voz alta, lentamente.- Maria Emília, nascida em vinte de maio de mil oitocentos e falecida…- Deixou cair o palito e ficou um instante imóvel – Mas esta não podia ser sua namorada, morreu há mais de cem anos! Seu menti…
Um baque metálico decepou-lhe a palavra pelo meio. Olhou em redor. A peça estava deserta. Voltou o olhar para a escada. No topo, Ricardo a observava por detrás da portinhola fechada. Tinha seu sorriso meio inocente, meio malicioso.
– Isto nunca foi o jazigo da sua família, seu mentiroso? Brincadeira mais cretina! – exclamou ela, subindo rapidamente a escada. – Não tem graça nenhuma, ouviu?
Ele esperou que ela chegasse quase a tocar o trinco da portinhola de ferro. Então deu uma volta à chave, arrancou-a da fechadura e saltou para trás.
– Ricardo, abre isto imediatamente! Vamos, imediatamente! – ordenou, torcendo o trinco.- Detesto esse tipo de brincadeira, você sabe disso. Seu idiota! É no que dá seguir a cabeça de um idiota desses. Brincadeira mais estúpida!
– Uma réstia de sol vai entrar pela frincha da porta, tem uma frincha na porta. Depois, vai se afastando devagarinho, bem devagarinho. Você terá o pôr do sol mais belo do mundo.
Ela sacudia a portinhola.
– Ricardo, chega, já disse! Chega! Abre imediatamente, imediatamente!- Sacudiu a portinhola com mais força ainda, agarrou-se a ela, dependurando-se por entre as grades. Ficou ofegante, os olhos cheios de lágrimas. Ensaiou um sorriso. – Ouça, meu bem, foi engraçadíssimo, mas agora preciso ir mesmo, vamos, abra…
Ele já não sorria. Estava sério, os olhos diminuídos. Em redor deles, reapareceram as rugazinhas abertas em leque.
– Boa noite, Raquel.
– Chega, Ricardo! Você vai me pagar!… – gritou ela, estendendo os braços por entre as grades, tentando agarrá-lo.- Cretino! Me dá a chave desta porcaria, vamos!- exigiu, examinando a fechadura nova em folha. Examinou em seguida as grades cobertas por uma crosta de ferrugem. Imobilizou-se. Foi erguendo o olhar até a chave que ele balançava pela argola, como um pêndulo. Encarou-o, apertando contra a grade a face sem cor. Esbugalhou os olhos num espasmo e amoleceu o corpo. Foi escorregando.
– Não, não…
Voltado ainda para ela, ele chegara até a porta e abriu os braços. Foi puxando as duas folhas escancaradas.
– Boa noite, meu anjo.
Os lábios dela se pregavam um ao outro, como se entre eles houvesse cola. Os olhos rodavam pesadamente numa expressão embrutecida.
– Não…
Guardando a chave no bolso, ele retomou o caminho percorrido. No breve silêncio, o som dos pedregulhos se entrechocando úmidos sob seus sapatos. E, de repente, o grito medonho, inumano:
– NÃO!
Durante algum tempo ele ainda ouviu os gritos que se multiplicaram, semelhantes aos de um animal sendo estraçalhado. Depois, os uivos foram ficando mais remotos, abafados como se viessem das profundezas da terra. Assim que atingiu o portão do cemitério, ele lançou ao poente um olhar mortiço. Ficou atento. Nenhum ouvido humano escutaria agora qualquer chamado. Acendeu um cigarro e foi descendo a ladeira. Crianças ao longe brincavam de roda.
Lygia Fagundes Telles In:.Antes do Baile Verde. 1970.
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NOTA DA BLOGUEIRA: É por isso que não sou amiga de ex-namorado ahahahah